A criação deste blog teve por objetivo divulgar o trabalho do Núcleo de Estudos de Política Econômica (NEPE) da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul. As atividades do NEPE foram encerradas oficialmente em abril de 2018, por força de decreto do governo estadual do Rio Grande do Sul. As opiniões aqui expostas não refletem quaisquer posições oficiais desta instituição ou de qualquer outra, sendo de responsabilidade exclusiva do autor do blog. Neste momento o objetivo é contribuir para a preservação do patrimônio imaterial da FEE, bem como divulgar e avaliar criticamente as análises econômicas realizadas no Rio Grande do Sul.

12 de mar. de 2013

Efeito temporário da crise sobre a América Latina


Têm sido frequentes as referências à “grande depressão” dos anos 1930 para caracterizar as dificuldades econômicas hoje enfrentadas pelos Estados Unidos e União Européia, decorrentes da crise financeira de 2008. Do ponto de vista do impacto da crise sobre os países latino-americanos, este paralelo é adequado?
Os dados disponíveis na literatura sobre os efeitos da crise de 1929 indicam não só que, naquela ocasião, houve uma redução muito abrupta nas receitas de exportação dos países latino-americanos, mas sobretudo que a recuperação posterior dos preços e volumes exportados foi extremamente lenta. As séries históricas disponibilizadas pela CEPAL para o conjunto da América Latina mostram que em 1940 o poder de compra das exportações permanecia inferior ao registrado em 1930. Sem entrada de capitais externos, as condições daquela década caracterizam bem o que Maria da Conceição Tavares denominou “estrangulamento externo absoluto”.
As informações disponíveis para o período posterior a 2008 nos permitem avaliar se as consequências desta última crise foram tão significativas para os países latino-americanos como nos anos 1930. É preciso observar previamente que o período 2004-2008, imediatamente anterior à crise, foi bastante favorável para a região. O ritmo de crescimento deste período não era registrado desde os anos 1970. Houve sensível melhora nos termos de troca e foram registrados sucessivos superávits nas transações correntes com o resto do mundo. Em conjunto com elevados influxos de capital, tal condição permitiu expressiva acumulação de reservas internacionais.
A intensificação das perturbações nos mercados financeiros internacionais em 2008 induziu naturalmente à expectativa de que, mais uma vez, eventos exógenos interromperiam o ciclo de crescimento da região. De fato os dados relativos ao ano de 2009 são extremamente negativos, mas os dados relativos à posição externa da região nos anos seguintes mostram uma robusta recuperação. Conforme mostra o gráfico, embora tenha havido piora dos termos de troca e redução do poder de compra das exportações em 2009, já no ano seguinte o nível de 2008 foi plenamente recuperado e a trajetória de crescimento foi mantida nos anos posteriores. No que diz respeito ao fluxo de capitais nem houve, a rigor, uma interrupção da entrada de recursos na região. Ocorreu, de fato, uma redução do influxo líquido de capitais entre 2007 e 2008, mas ainda assim ingressaram, neste ano crítico, cerca de US$ 70 bilhões em termos líquidos. Patamar semelhante foi mantido em 2009 e a partir de 2010 verifica-se persistente crescimento, atingindo o montante sem precedente histórico de US$ 200 bilhões em 2011.



Assim, independente da validade ou não da comparação entre os anos 1930 e os anos recentes no caso das economias desenvolvidas, o paralelo não parece adequado no caso da América Latina. A região como um todo parece ter, inclusive, recuperado seu ritmo de crescimento já em 2010 e 2011. Dos países maiores, o Brasil é o que tem apresentado menor taxa de crescimento, devido à relutância dos formuladores de política econômica a adotar uma postura mais expansionista que possa aproveitar o cenário externo ainda favorável. 

Publicado na Carta de Conjuntura da FEE [link]

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