A criação deste blog teve por objetivo divulgar o trabalho do Núcleo de Estudos de Política Econômica (NEPE) da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul. As atividades do NEPE foram encerradas oficialmente em abril de 2018, por força de decreto do governo estadual do Rio Grande do Sul. As opiniões aqui expostas não refletem quaisquer posições oficiais desta instituição ou de qualquer outra, sendo de responsabilidade exclusiva do autor do blog. Neste momento o objetivo é contribuir para a preservação do patrimônio imaterial da FEE, bem como divulgar e avaliar criticamente as análises econômicas realizadas no Rio Grande do Sul.

27 de jan. de 2011

Entrevista sobre política monetária

Essa entrevista saiu no Jornal do Comércio do dia 21 de janeiro, quase igual ao que aí está. Modifiquei apenas alguns trechos para ficar mais claro. Olhando agora acho que faltou falar algo sobre os esquemas de indexação das tarifas de serviços como energia, comunicações, assim como os aluguéis pelo IGP-M. Fica para uma próxima

CORECON/RS – Como podemos analisar o comportamento do Banco Central nesta primeira reunião do Copom no ano?

Fernando Lara – A postura do BC tem sido a de agir de acordo com a expectativa do mercado. Dificilmente contraria, principalmente quando é para subir. Na minha opinião, a intenção da política monetária é essencialmente colocar a taxa de juros no Brasil acima das praticadas no exterior. Esta medida provoca a entrada do capital, pela remuneração mais alta dos títulos brasileiros, gerando queda do dólar. Este é o mecanismo.

CORECON – Mas vale a pena a medida na relação custo- benefício?

Lara – Acredito que é a queda do dólar, e não a contenção da demanda doméstica, que funciona para conter a inflação – idéia que gera polêmica em relação a outros economistas. Para mim, a inflação recente vem, na verdade, de fora, pela tendência de elevação dos preços dos alimentos no mercado internacional. A valorização do câmbio é uma forma de compensar este aumento externo.

CORECON – Mas por que esta política é contestada por muitos especialistas?

Lara – O problema é que esta política gera uma perda de competitividade das exportações. Seria necessário manter uma taxa de juros mais baixa, com câmbio mais alto. Mas teríamos que relaxar um pouco a meta de inflação. Nas atuais condições o efeito final seria um tanto incerto.

CORECON - A inflação, então, ainda assusta ?

Lara – Sim, mas os fatores, como disse, são mais externos, tem a ver com a demanda mundial por alimentos que está muito forte, elevando os preços e rebatendo aqui. Não é uma inflação doméstica. Mas é preciso destacar que a política para segurar a inflação tem sido um obstáculo para um crescimento econômico mais duradouro, pois as exportações são componente importante para este crescimento.

CORECON – Poderíamos dizer que o BC deveria ser mais atento para outros aspectos comprometidos por esta política monetária?

Lara - É por isso que se diz que o Banco Central é pouco sensível para a questão do crescimento. Ao exercer esta política, ele alega que a missão é manter a inflação dentro da meta, sem levar muito em conta os efeitos sobre outras variáveis como o câmbio, que é supostamente flutuante. Eles costumam “lavar as mãos” em relação a isso, ao dizer que não é responsabilidade do BC.

CORECON – Considerando tuso isso, dá para questionar a chamada autonomia do Banco Central?

Lara – Ela pode ser questionada. Na prática, a instituição tem agido de forma independente, ao valorizar o fato de não sofrer influência política. Mas se agente pensar melhor, o BC pode ser autônomo em relação ao Governo Federal. Mas seria autônomo em relação a outros atores da sociedade? Talvez bem menos autônomo em relação a Federação dos Bancos, que tem influência grande na gestão da entidade. A tal independência em relação ao governo só reforça a dependência que tem em relação a outros setores da economia.

CORECON – Mas a elevação já na primeira reunião do ano tem uma força também simbólica?

Lara – Acredito que a razão deste aumento tem a ver com preocupação de setores da sociedade em relação à inflação registrada no ano passado, que ficou um pouco acima da meta. Foi uma exigência e este meio ponto percentual é significativo. O presidente anterior do BC, Henrique Meirelles, não contrariava as expectativas do mercado. O que resta é saber como será a postura do atual presidente para o futuro.

CORECON – Independente destas relações políticas, dá para dizer que o BC estaria precoupado em manter sob controle uma das principais conquistas da economia: a estabilidade?

Lara – Sim. Mas esta conquista acabou virando um fim em si mesmo. O problema é que se tem exagerado nas doses. É preciso dizer que a nossa política monetária continua sendo uma das mais conservadoras do mundo. E, em termos reais, descontando a inflação, a taxa de juro real do país segue na condição de uma das mais elevadas do planeta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário